
Foi nas madrugadas do final dos anos 1950, no apê de Nara Leão na Avenida Atlântica, Copacabana, que João Gilberto dedilhou os acordes de “Bim Bom” que inspirou a Bossa Nova. João gostava dessas onomatopeias musicais como “O-Bá-Lá-Lá”, gravado no antológico LP “Chega de Saudade”, de 1959, que encerra o lado B com “É luxo só”, de Ary Barroso. E assim começou a Bossa Nova que brotou daquela turma da mais fina flor brasileira. Os ares 70s e a influência de Vilanova Artigas na seleção dos materiais, que paira no apê de Sergio Zobaran, paulista dos Jardins desde 2004, faz que o som que venha à minha mente, quando vou chez lui, é o dedilhado do violão do João, um baiano que deveria ter nascido no Rio. Zoba, como SZ é chamado pelos amigos do eixo Rio-SP, ao contrário de João, é carioca da gema. Sua mãe, Dona Cora Zobaran, é atriz, faz comerciais na tevê, nos quais esbanja a simpatia herdada pelo filho.
Promoter dos craques – de Moët & Chandon, Cartier, Louis Vuitton, Montblanc, Jaguar Cars, Rock in Rio a MostraBlack e tantos outros –, autor de livros (“Evento é assim mesmo!” da Editora Senac-RJ, já na 10ª edição), ele viu, veio, venceu em São Paulo com suas 1.001 habilidades. “Faço comunicação em arquitetura, decoração e design, curadoria, RP, e tenho sociedade com Maria di Pace no evento Modernos & Eternos”, diz com todos os erres e chiados o profissional que fez jornalismo na PUCRJ e teve, em 1976, como primeira missão, entrevistar o mestre Zanine Caldas para o Caderno B do finado Jornal do Brasil (por onde também passei). SZ jamais imaginaria que nas entrelinhas estava escrito que mais tarde faria curadoria de mostras do filho, o designer Zanini de Zanine, que tem nas veias o talento paterno.
“Ele fez uma escultura de madeira dedicada a mim, com a assinatura dele e o meu nome gravados a fogo no verso”, revela sobre o bloco compacto de ipê, esculpido em 2008, arrimado contra a parede de tijolos à vista pintados de branco no living, uma das texturas que imprimem originalidade ao projeto do designer de interiores, Maximiliano Crovato, autor da reforma. “Nome ascendente entre a nova geração de criadores, Max direciona seu traço para um high décor onde os acabamentos são minuciosamente estudados, numa mistura fina de cor, textura, estampa e convite ao toque. Seu trabalho poderia ser a antítese da escola do mestre brutalista – nua, crua, descarnada, onde a verdade dos materiais soa como fratura exposta e extrai sua plasticidade exatamente dali. Mas no apê do Zobaran, ao contrapor, de forma pronunciada, todos esses elementos com a hipoderme do concreto, ele evoca uma lição artiganiana que vai ainda além do puro aspecto work in progress: as diferenças podem – e devem – ocupar o mesmo espaço, sem colisões”, analisa nosso diretor Allex Colontonio, artiguista roxo, como se dizia no Rio bossa nova.
Assim como a Cidade Maravilhosa tem os altos e baixos de suas montanhas e praias, o apê de Zobaran, também é articulado de maneira atípica. Sua “praia” está configurada no andar térreo do prédio, em 120 metros quadrados que acomodam o bochincho do social espalhado pelo living, sala de jantar, biblioteca, lavabo, banheiro e cozinha. Os morros cariocas, aqui, equivalem aos outros 90 metros quadrados de área íntima alojada no sétimo andar que abriga seu quarto (“originalmente, dois quartos com varanda”), quarto de vestir (“antiga sala”), sala de banho, varanda e cozinha privée. “O apê tem uma base industrial – paredes de tijolos à vista, concreto e canos aparentes – e clima atual que mistura o vintage ao contemporâneo. O resultado ficou próximo à arquitetura do prédio, de 1948, em estilo neoclássico. Quanto às árvores e à igreja em frente, elas lembram o Rio onde nasci”, arremata com seu inconteste charme carioca.