
A estrutura é tão elementar quanto a vegetação típica que orbita o monólito horizontal, incluindo os vistosos manacás da serra: um quadrado com cubo de vidro no centro, que brinca com a luz, com o ar, as nuvens e o longe, a uma altitude de 1.200 metros. Dali, nos dias claros, é possível ver o “mar” de montanhas ondulando quase 60 quilômetros de horizonte.
A poética transcende o traço e o discurso do arquiteto nessa residência minimal – e essencial – em Nova Lima. Gustavo Penna, que tem escritório sediado em Belo Horizonte, revisitou a boa e velha articulação das casas coloniais das Gerais, com espaços amplos e aconchegantes, reconfigurados na métrica dos novos tempos. “Qualquer ponto da casa participa do movimento do todo. A gente se sente acompanhado: não existe lugar para a solidão. Os percursos são cheios de surpresas: a natureza longínqua, o jardim interno bem perto do olhar; as larguras e as alturas que variam junto com a luminosidade, as passagens, os enquadramentos, as perspectivas”, diz.
Com 844 metros quadrados de área construída em terreno quatro vezes maior, a morada premiada (The International Architecture Award 2011 + WAF – World Architecture Festival) se organiza em dois pavimentos. O superior, que fica no nível da rua, permite o acesso dos visitantes por meio de ponte sobre espelho d’água com repuxo, chegando à galeria que liga as duas alas que ladeiam a sala principal, separada pelos jardins – cuja forma se vislumbra mesmo de fora, pelo cubo vítreo. A área íntima, com os quartos, ocupa toda uma ala. Sala de jantar e de TV, cozinha e despensa ocupam a outra. A varanda transversal dá continuidade ao ambiente da sala, conectada à cozinha. Duas escadas – uma em cada uma das alas, e um elevador na galeria –, fazem a conexão com o pavimento inferior, garantindo a separação dos fluxos de serviço e social. No piso inferior está a garagem, com oficina, lavanderia, dependências de empregados, área técnica, sala de costura e adega com escritório.
Mas o tudo acontece mesmo lá em cima, no cubo de vidro que encapsula as áreas sociais, incluindo o living com pé-direito altíssimo, que parece alcançar as estrelas. O mobiliário portentoso, composto por grandes estofados e peças de madeira em tor sur ton de uma paleta natural, inclui bancos e poltronas de Sergio Rodrigues. Nesse compêndio também entra a poltrona de Oscar Niemeyer, negra e sinuosa, que funciona como um ponto de exclamação no décor, contrastando com peças dos anos 1950 e 1960.
“A chegada por meio da ponte sobre o espelho d’água propõe um ritual, uma espécie de purificação. E a casa nos acolhe, generosa”, conclui Penna, contemplando o “oceano” de montanhas.