
Entre as belas, as feras – e os monstros do Lago Ness – que orbitam o grande açude do décor nacional, Consuelo Jorge é uma das raras unanimidades: todo mundo ama. Não é difícil entender por que. Quando a gente chega ao escritório da arquiteta, no sexto andar de um arranha- céu portentoso no bairro do Itaim, São Paulo, e se depara com o mesão amarelo Ferrari apinhado de miniaturas, bonecos articulados e plantas baixas empilhadas, entendemos o astral: do outro lado da bancada está alguém que, de fato, adora o que faz. E cuja produção incansável não sucumbiu aos processos pasteurizados que entram no combo do sucesso. Por exemplo: enquanto você lê esta matéria, ela se prepara para entregar as decorações de 28 (sim, vinte e oito!) hotéis de alto padrão, de Belo Horizonte ao Distrito Federal. Também fala com empolgação sobre os “filhotes” residenciais, os corporativos, as mostras de décor que vai encarar e as que engavetou, por infortuna falta de tempo. Tudo sem fechar o sorrisão de 3.957 dentes que se tornou sua marca registrada, é claro!
Como tudo o que salta das suas pranchetas, essa casa de campo em Itu é uma das responsáveis pelo bom humor e simpatia: projeto espetacular e sem extravagâncias, recheado com o bom e o melhor do design, com parceria de peso no paisagismo, e cliente ainda mais feliz do que ela, que pegou o bonde andando. “O dono da casa já era meu cliente – projetei seu apartamento em São Paulo –, e ele me chamou para cuidar dos interiores do seu retiro de fim de semana, quando a arquitetura já estava pronta”, diz. O briefing prescrevia o básico: casa funcional, de linhas simples e acabamentos práticos, mas com mobiliário sofisticado e moderno. “De onde eu estiver quero ver um jardim”, encomendou o publicitário. Pelo verbete “jardim”, não vá pensando numa moita aqui e numa samambaia acolá.
Alex Hanazaki, nosso paisagista número um – eleito o melhor do mundo pela Sociedade Americana de Arquitetos e Paisagistas, em Denver, nos EUA –, orquestrou flamboyants, sibipirunas, plátanos, paus-formigas e outras maravilhas babilônicas, em alguns momentos pensadas para dosar privacidade nos limites do lote, outras para fazer sombra, e outros tantos para reproduzir uma lasca do paraíso mesmo. “Sou parceiro da Consuelo há mais de 15 anos. Temos uma sintonia de gosto, de timing, de objetividade”, elogia, engrossando o fã-clube da arquiteta. Na fachada, orbitada por paineiras na altura da construção, a vegetação que parece fazer o volume arquitetônico flutuar é o capim-do-texas – que Hanazaki usou em três diferentes tonalidades. Um grande jardim vertical dá as boas-vindas a quem chega. E logo o visitante se depara com o amplo living com pé-direito duplo e dois painéis de vidro em “L” que proporcionam o primeiro visual enquadrado da paisagem, com a piscina em lâmina d’água. O espaço decorado em tons de cinza e móveis assinados por masterpieces comprova a antena de Consuelo. O sofá da Micasa, robusto em seus cinco metros, valoriza o espaço em harmonia com as vistosas poltronas Amoebe Highback, da Vitra, e a composição de mesas de centro do catarinense tipo exportação Jader Almeida. As mesas laterais de Paulo Alves acentuam a pimenta brasuca. Apoiadas sobre os aparadores de Poul Kjaerholm, as telas de Manoel Novello dão o tom despojado junto ao trabalho de grafite e acrílica sobre papel de Guilherme Dable. A luminária da Foscarini, desenhada por Marc Sadler, acende o clima. Minimal, mas não monástico – como o luxo contemporâneo deve ser. E autoral, of course.
Toda a marcenaria – incluindo o painel de cumaru da entrada – foi desenhada pela arquiteta e executada pela W Cardoso. Grandes painéis de vidro Cinex interligam o home theater – com tapetão lindo By Kamy – e sala de jantar à cozinha. Na comedoria, por sinal, que tem mais cadeiras de Jader Almeida, a luminária da Moooi sobre a mesa Slpay e o buffet Boss cor abóbora, da Micasa, não passam despercebidos.
Um estar com vista para a piscina de borda transbordante – onde Alex plantou gardênias e congeias – foi decorado com móveis da Casual. Debaixo da jabuticabeira, estão as espreguiçadeiras da Art Forma. Pelo caminho de capim – às vezes verde, às vezes vermelho, às vezes mais claro –, a casa se abre para um pátio com deque de madeira que se projeta em direção ao horizonte. Um charmoso lounge encaixado no deque e sombreado pela copa enorme de uma árvore aproveita o desnível do terreno. “Pensamos nesse ipê branco quase como um ombrellone natural”, diz Hanazaki, alguém que, assim como Consuelo Jorge, gosta de navegar em águas claras.